Eutanásia, de peito aberto

A abreviação da vida, seja ela humana ou animal, é uma decisão polêmica. E, no centro de tanta controvérsia, há sempre muita dor e dúvida. A eutanásia já passou pela trajetória de Claudia Pizzolato duas vezes. Pioneira no treinamento de cães, no Rio de Janeiro, e à frente da BitCão, loja virtual de produtos para pets, nem toda a experiência em lidar com comportamento e situações inesperadas preparou Claudia para a despedida de Zucco, seu cão há 16 anos.

Neste entrevista, concedida apenas duas semanas após a partida de Zucco, Claudia fala sem moralismo e de peito aberto sobre o luto, o papel do veterinário nos últimos momentos do pet e o difícil o caminho até a eutanásia: “não é sacrificar, é livrar o animal do sacrifício”.

 

Claudia, recentemente você perdeu o Zucco, seu cão por quase duas décadas…

Sim, Zucco chegou aqui em casa com 2 ou 3 anos e viveu até os 16. Ele foi um marco, porque era muito meu amigo, sempre ao meu lado. Nos despedimos dele há duas semanas (início de outubro). Ele foi o último cão da matilha. Antes dele, partiram Beef (15 anos), Dharma (12) e Biba (16).

 

Com o Zucco, você optou pela eutanásia. Por ter tido muitos cães e gatos e, ao longo dos anos, ajudado tanta gente a melhor se relacionar com os animais, o que é importante para quem está passando por esse momento de despedida do pet?

Faz muita diferença quando você conhece o veterinário que está lidando com os momentos finais do seu pet. Você se sente acolhida, não julgada. Eu tenho a sorte de ter veterinários que são amigos e seres humanos maravilhosos. Eles me ajudaram na decisão de fazer ou não e quando fazer a eutanásia. A decisão sobre a eutanásia é difícil até ser tomada.

 

Zucco, Claudia e o radiologista Dr Rômulo Braga, no CRV Imagem.

 

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E você já tinha passado por essa situação antes. Por que com o Zucco foi diferente?

Com a Biba eu entrei em pânico, porque ela passou mal de madrugada, estava sofrendo e eu precisava interromper aquele sofrimento o mais rápido possível. Naquele momento, estava sem o apoio direto dos meus veterinários e precisei correr para uma clínica. O que torna tudo mais difícil e doloroso pois, além de você não conhecer o veterinário, há outras regras que criam uma atmosfera totalmente diferente daquela da sua casa e com a qual o cão não está acostumado. A clínica não é a sua casa, não é o seu colo.

Com o Zucco fez diferença estar na casa onde ele cresceu, com as pessoas e cheiros que ele conhecia, sem medo ou ansiedade.

 

 

Pra você que papel o veterinário desempenha nesse momento?

Às vezes, as pessoas estão sem saída. Um veterinário que te conhece, ouve e é sensível aos seu sofrimento e sentimentos, não te julga. Ao contrário, ele te aconselha, analisa a situação sob o viés da expectativa de vida e te guia à decisão mais correta e segura. O veterinário deve fazer com que a gente se sinta em casa até onde for possível, respeitando a despedida, os nossos rituais e, sobretudo, a forma como expressamos toda essa dor.

 

Que conselhos você dá para quem está vivendo o luto?

Tem gente que administra a perda, assumindo um outro animal. E não há nada de errado nisso! Mas o meu conselho é: não tente ter de volta quem se foi! Pegue um pet de outra raça, cor, de um outro lugar. Essas medidas podem ajudar você a não ficar comparando um animal com o outro, e a dar ao novo pet a chance de ser um indivíduo feliz.

 

E o que mais?

De forma geral, hoje, a sociedade não te deixar entrar em luto. Eu mesma passei por isso. Não te deixam ficar triste, chorar. Mas, em todo caso, é bom dar um prazo ao luto. Não entre demais na escuridão. Se você fez tudo o que era possível pelo seu pet, não sinta culpa se a eutanásia foi o caminho escolhido.

 

Mas nem todo mundo segura a barra da eutanásia…

Não. E há que se respeitar os que amam tão intensamente que precisam viver a dor até o último minuto.

Quando eu tenho um animal, me torno responsável por ele, incondicionalmente. Cuido com todo meu amor, me desdobro em recursos, tempo, companhia, ofereço o meu melhor. Então, pra mim, e isso é muito particular, prefiro eu sofrer a deixar o animal sofrer. Porque a gente entende o porquê do sofrimento; eles, não. Eles precisam ter prazer e dignidade enquanto estão vivos.

Eutanásia não é sacrifício, é livrar o animal do sacrifício. Procure tomar a decisão quando você e o animal estiverem prontos. E depois da decisão tomada, fique bem, fique bem.

 

 

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