Dr João Galvão: Por uma Veterinária Mais Eficaz com a Medicina Interna

Especialista em Medicina Interna no VCA Arboretum View Animal Hospital, nos EUA, Dr João Felipe Galvão chega em São Paulo, agora em setembro, para abrir a primeira turma do seu curso “Masterclass em Medicina Interna”. O curso fala aos veterinários formados que desejam melhorar sua capacidade de diagnosticar, tratar e usar a medicina valendo-se dos preceitos da medicina interna. Não sabe bem o que é “medicina interna”?! Bem, essa é a nossa primeira pergunta. Acompanhe!

 

Dr João, o termo “medicina interna” já é bem consolidado nos EUA, mas aqui ainda há dúvida a seu respeito. A que ele se refere exatamente?

Medicina interna é a especialidade que abrange algumas áreas da clínica médica como endocrinologia, nefrologia e urologia, gastroenterologia, imunologia, pneumologia, hematologia e infectologia. Por exemplo, nos EUA, não existem gastroenterologistas veterinários. Os veterinários que se especializam em medicina interna são os gastroenterologistas. Alguns nomes internacionalmente na área são Dr. Ettinger, Dr. DiBartola, Dr. Twedt, Dr. Feldman, entre outros.

 

Conhecendo bem as culturas e os desafios de educação no Brasil e EUA, você poderia apontar os principais pontos que, se trabalhados, poderiam aumentar muito a eficiência nos atendimentos veterinários por aqui?

Dois pontos chaves no aumento da eficiência nos atendimentos são a importância de educação do tutor e o trabalho em equipe.

Não tem como fazer com que os tutores possam ajudar seus animais sem que eles entendam o que está acontecendo e as vantagens e desvantagens de cada recomendação.

O veterinário precisa de um time ao seu redor para aumentar a sua eficiência. Nos EUA, os veterinários só fazem aquilo que só eles podem fazer, todas as outras tarefas são feitas pelos seus ajudantes (normalmente technicians – equivalente ao auxiliar de enfermagem veterinário). É importante treinar o time e ter uma missão em comum para padronizar os tipos de informações a serem dadas. Um veterinário com um bom time pode ser de 2 a 4 vezes mais eficiente.    

 

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O seu curso “Masterclass em Medicina Interna” tem uma proposta muito interessante de mostrar aos alunos como o raciocínio lógico e a criação de boas listas de diagnósticos diferenciais podem amplificar o resultado de tratamento. Você acredita que isso poderá promover um uso mais consciente e assertivo dos métodos diagnósticos auxiliares?

 

A abordagem através de problemas é essencial. O clínico que a utiliza é mais eficiente nas escolhas de métodos diagnósticos complementares e é mais certeiro em seu diagnóstico. Noto que os erros mais comuns, incluindo casos no Brasil, são aqueles em que os clínicos possuem dificuldade de priorizar os problemas, não avaliam o histórico de forma crítica, possuem dificuldades de interpretar minúcias nos exames complementares, não possuem um boa lista de diagnósticos diferenciais e não conseguem priorizar essa lista.

A chave não é apenas eliminar os diagnósticos diferenciais de um problema, mas também saber se esse é o problema principal e como eliminar diagnósticos diferenciais de uma forma lógica.

 

Poderia dar um exemplo prático?

Chega à sua clínica um cão SRD de 4 anos, fêmea castrada, com histórico de apetite voraz, consumindo duas vezes a quantidade de calorias necessárias, perda de peso e diarreia.

Diagnósticos diferenciais importantes para perda de peso com apetite voraz são:

  • insuficiência pancreática exócrina;
  • má-absorção (ex: doença inflamatória intestinal, linfoma, histoplasmose, linfangiectasia);
  • hipertiroidismo;
  • e diabetes mellitus.

 

Neste caso, um ultrassom abdominal não seria um exame complementar que o ajudaria a elencar os possíveis diagnósticos diferenciais. No entanto, o clínico recomendou um ultrassom abdominal. No ultrassom foram encontrados cistos renais, cálculos renais e glândulas adrenais no limite inferior (3.5 mm de diâmetro).

A recomendação de um teste inadequado para o diagnóstico do problema inicial auxiliou no achado de outros problemas que provavelmente são incidentais, e não relacionados à queixa principal.

Baseado no achado de adrenais possivelmente pequenas no ultrassom, o clínico poderia recomendar um teste de estimulação por ACTH para descartar hipoadrenocorticismo, embora o cão não tenha apresente sinais compatíveis com hipoadrenocorticismo. Os testes recomendados para esse cão seriam o TLI (tripsine-like immunoreactivity para descartar insuficiência pancreática), T4 total, glicose sérica e biópsias gastrointestinais. Num cão sem poliúria e polidipsia, diabetes é bastante improvável. O mesmo vale para hipertireoidismo: muito raro em cães, principalmente num cão jovem.

Com isso, se o tutor quisesse descartar um diagnóstico diferencial de cada vez, o teste mais importante seria o TLI. Este seria seguido por biópsias gastrointestinais para descartar má-absorção. Exames laboratoriais incluindo T4 e glicose sérica seriam feitos antes, não pela preocupação de serem prováveis diagnósticos diferenciais, mas porque é importante fazer exames laboratoriais pré-anestésicos.  

Esse é um exemplo simples que mostra a importância no foco do problema, nas escolhas dos exames complementares, na análise interpretativa crítica de diagnósticos, além da priorização dos exames complementares.   

 

 

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Dr João, conte para gente como funcionará a Monitoria Virtual, que acontecerá entre os dois módulos do seu curso.

A função da monitoria virtual é fazer com que alunos coloquem em prática o que aprenderam no Módulo 1. A prática da abordagem de problemas será essencial para que o aluno modifique a sua abordagem clínica e treine essa mudança em seus pacientes. Os professores irão auxiliar os alunos através de casos reais (dos alunos) com relação à melhor abordagem possível para seus casos de medicina interna. Se não houver casos dos alunos, os professores trarão casos para que os alunos resolvam.

 

 

 

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